A ESCOLA E A DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA: INTERSECÇÕES URGENTES E NECESSÁRIAS
- Eliana Vianna Brito Kozma
- 11 de jul. de 2024
- 5 min de leitura
Atualizado: 16 de abr.
Por Eliana Vianna Brito Kozma
Coluna: Educação e Ciência

Ao ser convidada para escrever sobre a temática: relações entre a Educação e a Divulgação Científica, fiquei pensando: é tão evidente a conexão entre Educação e Ciência, é tão óbvia, que parece ser impossível questionar a importância de tal relação.
No entanto, infelizmente, vivemos em tempos de negacionismo científico, em tempos de desvalorização do espaço escolar como local privilegiado para a construção do conhecimento formal, em tempos em que o terraplanismo e a descrença da eficácia das vacinas tomaram conta do imaginário de inúmeros brasileiros. Então, nesse contexto, faz-se cada vez mais necessário reafirmar o quão importante é a Educação (com letra maiúscula, sim!), seja ela formal – adquirida nos bancos escolares, nas instituições de ensino - ou informal – desenvolvida em contextos familiares, religiosos, recreativos etc .
Sabemos que, em seu sentido mais amplo, a Educação exerce um papel fundamental na socialização dos indivíduos, na assimilação e aquisição de conhecimentos, na sensibilização cultural. É por intermédio da Educação que as novas gerações apreendem formas de viver a partir das experiências e conhecimentos das gerações anteriores. Podemos ir além e considerar que estamos em contínua busca pelo “Bem Viver”, tema de origem indígena, da língua quíchua, com grande repercussão na América Latina principalmente a partir das constituições do Equador, em 2008 e da Bolívia, em 2009. O Bem Viver se relaciona às concepções de vida saudável, bem-estar, qualidade de vida, desenvolvimento humano, além de ter um destaque em projetos dos governos boliviano e equatoriano (Alcântara; Sampaio, 2017).
Já os pesquisadores Cunha e Sousa (2023), apoiando-se nos estudos de Oliveira e Lucini (2021), consideram que a sistematização de usos do conceito de Bem Viver, cuja origem remonta a povos indígenas da América Latina, representa um pensamento decolonial, uma alternativa que procura dar vez, voz e visibilidade aos povos oprimidos que foram silenciados durante anos a fio. Ou seja, retomando as ideias de Avila (2021), trata-se de um projeto de libertação social, político, cultural e econômico que objetiva dar respeito e autonomia não só aos indivíduos de uma maneira geral, mas também e, principalmente, aos grupos e movimentos sociais, como o feminismo, o movimento negro, o movimento ecológico, o movimento LGBTqia+. Essa perspectiva decolonial traz a possibilidade para pensarmos uma prática de pesquisa de resistência, de uma produção local autônoma frente à europeia e norte-americana.
Tais considerações nos remetem ao papel da Educação Formal, isto é, ao papel da instituição Escola, como um locus singular, diferenciado, para a constante divulgação dos avanços da Ciência. Ora, o que é a Ciência? Derivada do latim scientia, etimologicamente tem-se o significado de “conhecimento” ou “saber”. Em sentido amplo, a Ciência pode ser entendida como o conhecimento organizado e sistemático sobre a natureza, a cultura e a sociedade, obtido por métodos científicos. Ao contrário do senso comum, que não demanda comprovações científicas, visto que se caracteriza pela manifestação de saberes e crenças do cotidiano, que variam conforme o indivíduo e sua cultura, a Ciência comporta um vasto conjunto de saberes por meio dos quais são elaboradas as teorias baseadas em próprios métodos e em pesquisas. Assim, vamos encontrar as Ciências Exatas, Ciências Humanas, Ciências Sociais, Ciências Biológicas, e cada uma delas apresenta suas especificidades.
Claro está que, diante dos avanços científicos e tecnológicos em nossa sociedade, faz-se necessário que a Escola cumpra seu papel no sentido de divulgar esses avanços, gradativamente, conforme o nível de escolaridade do educando, a fim de que possa contribuir para a formação de uma geração de indivíduos que não só reconheçam a importância da Ciência em suas vidas, como também sejam potenciais propagadores dos conhecimentos científicos resultantes de pesquisas criteriosas que visam à melhoria da qualidade de vida da humanidade.

Inegavelmente, é por intermédio da divulgação científica que ocorre uma desmistificação da Ciência como algo “sagrado”, destinado somente aos grandes pesquisadores e estudiosos especializados no assunto. A mídia, seja ela impressa, televisiva, radiofônica, digital, é claro, exerce um papel muito importante para que as descobertas científicas, nos mais diversos graus de complexidade, sejam compartilhadas para um número bem representativo de pessoas. Inúmeras revistas, sites, blogs, documentários televisivos, podcasts, entre outros veículos, contribuem com a divulgação científica, de modo mais acessível ao seu público-alvo. No entanto, é somente na Escola que o saber científico sistematizado, ordenado, criterioso, com vistas à construção do pensamento crítico dos educandos, tem seu lugar garantido.
Os estudiosos Xavier e Gonçalves (2014) consideram que “a divulgação científica tem como uma de suas funções principais facilitar a alfabetização científica, ou seja, aproximar os produtores de ciência e tecnologia do cidadão comum, contextualizando os fatos e resultados de pesquisas com a realidade das pessoas”. Dessa forma, o contexto escolar se transforma (ou deveria se transformar) no espaço privilegiado para trabalhar com as informações científicas que realmente importam para seus alunos, respeitando sempre o nível de instrução, faixa etária, histórias de vida e experiências adquiridas no convívio social e escolar. Teremos, assim, a possibilidade de formação de cidadãos muito mais conscientes e críticos acerca de seu papel social, nos mais diferentes contextos, como propagadores dos conhecimentos científicos que, sem dúvida, contribuem para uma sociedade mais saudável, harmônica, em que a concepção do ‘Bem Viver” se torne efetivamente uma realidade em nosso país.
Referências bibliográficas e materiais consultados
ALCÂNTARA, L. C. S; SAMPAIO, C. A. C. Bem viver: uma perspectiva (des)colonial das comunidades indígenas. Revista Rupturas, v. 7, n. 2, p. 1-31, 2017.
AVILA, M. A. Colonialidade e Decolonialidade: você conhece esses conceitos? 2021. Disponível em: https://www.politize.com.br/colonialidade-e-decolonialidade/ Acesso em 30 Maio 2024
CUNHA, E.V ; SOUSA, W. J. O bem viver no Brasil: uma análise da produção acadêmica nacional. Revista Katálysis, Florianópolis, v.26, n. 2, p. 321-332, maio/ago. 2023.
OLIVEIRA, E. de S.; LUCINI, M. O Pensamento decolonial: conceitos para pensar uma prática de pesquisa de resistência. Revista Boletim Historiar, v. 8, n. 01, 2021. Disponível em: https://seer.ufs.br/index.php/historiar/article/view/15456. Acesso em: 01 jun. 2024.
XAVIER, J.L.A; GONÇALVES, C.B. A relação entre a divulgação científica e a escola. Revista Areté, Manaus, v.7, n.14, p.182-189, 2014.
Sobre a autora

Eliana Vianna Brito Kozma é graduada em Letras pela Universidade Braz Cubas, e em Pedagogia pela Universidade Cruzeiro do Sul, possui Mestrado em Língua Portuguesa pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e doutorado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Atualmente é professor assistente doutor da Universidade de Taubaté e editora da revista online Caminhos em Linguística Aplicada. Faz parte do Conselho Editorial da Revista de Extensão da UNITAU e é parecerista Ad hoc das revistas Bakhtiniana e Entretextos. Encontra-se exercendo a função de Coordenadora do Programa de Pós-Graduação - Mestrado em Linguística Aplicada da Universidade de Taubaté. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/1199257075500335
Orcid: https://orcid.org/0000-0003-1356-4756 / E-mail: eliana.brito@unitau.br
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